Sempre que escrevo um poema, um poeta de verdade se remexe no túmulo, por dor ou por pena

sexta-feira, 4 de junho de 2010

- o mundo é um moinho

.
Ainda é cedo amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora da partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

Ouça-me bem amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões à pó. ♪
.
Não queria de forma alguma pensar em tudo isso de novo, fazia mal. Reviver momentos na memória. Inútil qualquer tentativa de aproximação. Partiu irremediavelmente. E ainda que tenha aceito isso como nova forma de vida, queria às vezes pensar no que poderia acontecer se não houvesse acontecido o toque dos corpos, das almas. Por um minuto. Ainda que falsamente. Utópico demais, pensar no que poderia ter sido e não foi. Às vezes a espera de uma carta ou um telegrama. Passa rápido. Passa rápido porque agora outro ser se misturava ao dela. Carne, corpo, alma, pensamento. Tudo. Idiota quem disse que não se esquece uma pessoa com outra. Esquece sim, esquece e passa. Fica só o gosto amargo daquilo que não tem nome. O ódio, o ressentimento. Da vida que foi negada, do perdão que foi negado, e das horas a sós que foram substituídas por bebedeiras com os amigos. Fácil era dizer agora que ela não o conquistara. Muito fácil, limpar o porão sujo agora que todos os móveis e entulhos foram retirados. Depois que a grande decisão foi tomada pelo dono da relação. Grande decisão? É, você pode definir também como seqüência de acontecimentos estranhos e desmedidos. Mas, será por quê? Não importava agora né, agora que...


Que imensa miséria o grande amor - depois do não, depois do fim - reduzir-se a duas ou três frases frias ou sarcásticas. Num bar qualquer, numa esquina da vida"
caio fernando abreu

quinta-feira, 3 de junho de 2010

• @beatlesfrases: The way you deceive me, I just don't understand

.
   Há muitas outras coisas que se poderia dizer sobre esse homem nesta noite turva, em que sento-me para escrever ao lado de uma garrafa de alguma coisa com teor alcoólico e um cinzeiro em que deposito as cinzas do meu Lucky Strike, o maço quase no fim.
   Que ele era legal, que era elegante e charmoso seria o mais clichê a que se poderia chegar, depois de tanto tempo. Que entendia sobre todos os assuntos e que era a pessoa mais especial these whole world... Que teria a mulher que quisesse quando quisesse, retórico demais.
   Uma coisa que não consegui dar nome, e que por mais que tente não compreendo muito bem, e entendo. Entendo por ora, antes de me ater aos detalhes e chegar a (in)conclusão de que não faz sentido nenhum. E pensei, durante certo tempo, que o que mais se poderia tirar dessa história toda - talvez inventada, talvez fantasiada para tornar-se nos mínimos detalhes real – era o significado. Hoje pressinto que é o que mais falta. Em forma de interrogações, tento decifrar esse nó que me atrela a tudo isso. Acendo mais um cigarro.
   Gastei quase todas as minhas fichas tentando apostar em uma teoria que pudesse chegar o mais perto possível do real. Percebo agora que não existe real. Tudo é irreal e atrelado ao fato de tentar inutilmente viver. Viver e ser lembrado, viver e ser esquecido. Amar até a última gota do ser. Consumir-se um no outro, noutro. Várias e várias vezes. Na esperança quem sabe de achar algo que faça parar, ficar para sempre. Sem mentiras, sem vergonhas, sem histórias mal contadas e passados que teimam em aparecer no presente. Utopia.
   Outros são os caminhos e sabe-se que na esquina de cada um deles há outras e outras mulheres. Com histórias que talvez pudessem fazer diferença na vida de alguém. Mas elas são de ninguém. E talvez ele seja assim.
   Acendo outro e outro cigarro. A vida é o que é, e as pessoas são o que são, mesmo pra quem vê de longe. People don't change !
   Há muitas outras coisas que se poderia dizer sobre esse homem nesta noite turva. Que ele era quase perfeito, e que só existia um defeito, mas era esse defeito que fazia com que se desacreditasse de todas as qualidades até então existentes. Poderia terminar o texto com uma música, mais ou menos assim: Te pego na escola e encho a tua bola com todo o meu amor. Te levo pra festa e testo o teu sexo com ar de professor. Faço promessas malucas tão curtas quanto um sonho bom. Se eu te escondo a verdade, baby, é pra te proteger da solidão. ♪ Mas agora e para sempre, o show não era interessante e ela não era o seu amor. Então termina-se assim, sem solos de violão ou piano. Talvez, um tango argentino, pena eu não conhecer nenhum. Poderia procurar algo aceitável aqui; mas acabaram os cigarros e o álcool está quase no fim.
.
.
“São aqueles que vêm do nada
e partem para lugar nenhum.
Alguém que aparece de repente,
que ninguém sabe de onde veio nem para onde vai
A man out of nowhere.”


(Nelson Brissac Peixoto: Cenários em Ruínas)
citado no conto VI : O Rapaz mais triste do mundo
de Os Dragões não conhecem o Paraíso - Caio Fernando Abreu.
* negrito - O rapaz mais triste do mundo ...
.
.