Sempre que escrevo um poema, um poeta de verdade se remexe no túmulo, por dor ou por pena

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

vero

Notei de repente que algo mudou esta semana. Não saberia dizer agora o que de especificamente ruim aconteceu para que de uma hora para outra algo se perdesse quase sem possibilidade de volta, pelo menos não de imediato. Nos últimos momentos da noite muitos queriam se afundar em uma boa dose de qualquer bebida forte. Inéditos frente o outro pessoas de repente se descobriram, ou se encobriram, ou criaram uma nova máscara sob a antiga, ou se caracterizaram. Em vestes do acaso tentaram se lançar, tudo em vão. Entre um copo e outro nenhum futuro promissor. Apenas as memórias criadas ou recriadas de um passado que insistiu em deixar marcas. Um dia inventamos que teríamos tempo para estudar, hoje inventamos que teremos tempo para amar. Por vezes pego-me inventando uma nova forma de viver, por vezes todos nós. Ainda não inventaram um remédio para os desesperados. Aquela noite no bar não tocou nenhuma música triste da madrugada, e não precisava. Mal imaginamos o esforço que é feito todo dia para (re)invetar viver, e nem sempre dá certo. Percorremos todos os dias os piores caminhos sem saber se há no final um pote de ouro. Tantas vezes sufocamos o amor que teima em surgir com pressa. Peço por não me tornar uma pessoas dessas em que o coração quase não bate. Entorpecidos naquela noite tentamos inventar uma nova forma de amar, mas nada funcionou. Quem quer fazer de toda vida uma nova acaba sem viver vida nenhuma. Acaba sem amar, mas talvez por isso mesmo acabe sem sofrer. E hoje, quando despedi-me de você percebi que algum lugar ficou perdido, em um buraco negro – e por isso mesmo – que nunca se pode resgatar. Hoje quando te abracei lembrei-me da noite no bar. Tão p e r t o, tão longe. Quem sabe um dia iremos sentar e descompromissadamente admirar a vida. Mas só nostalgia é o que tem pra hoje.



Chovia nas ruas do meu coração
Fora dos trilhos, cidades


Lua cheia clareava
Imaginei que sonhava
E era tudo real”

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

o conto mais triste do mundo

Descansa: pouco te chorarão...
O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas.
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é a coisa depois da qual nada acontece aos outros.

(Fernando Pessoa/Álvaro de Campos)

Pode entre o amor e a amizade alguém escolher o segundo? Eu respondo que não, e essa como todas as histórias do mundo não pode ser diferente. E não pode ser diferente não porque as personagens sejam comuns, porque não são, é simplesmente pelo fato de que no fim as justificativas para a felicidade sempre se encontram ligadas ao primeiro.

Já ia dar aquela coisa escura no coração, de quem perde alguma parte dele, sem nem mesmo saber por quê. E o que seguiria desde então seria um discurso dos amantes mal amados, que, creio não ser a questão. E ele diria coisas tolas como tudo se ajeita no final e sorriria como se sorri às pessoas de que se gosta muito. Lentamente ela sentiria que seu coração havia enfim se acalmado e conversariam sobre os últimos livros lidos.

No entanto, esse não é um dos casos em que a tristeza e a decepção podem ser substituídas por um sorriso e um abraço. E ela recusaria o abraço e partiria. Ele, mesmo imóvel, sentiria que naquele momento o fio que os ligavam havia se partido, e, dessa vez sem nenhuma chance de volta. E a chuva indicaria o fim de algo que sequer chegou a ser.

E não porque não o amasse, ou porque não o quisesse bem, ou porque ele havia deixado de ser seu melhor amigo, mas, porque não sabia mentir.

E não há, agora, motivo para os verbos das frases acima estarem no futuro do pretérito...

Escreveu a última carta, quase um bilhete, quase um apelo: - Desculpe, mas não posso morrer com você.

Nesse instante descobriu qual era o gosto que insistia em aparecer em seu paladar durante toda semana: era o de morte.