Sempre que escrevo um poema, um poeta de verdade se remexe no túmulo, por dor ou por pena

sábado, 25 de fevereiro de 2012

cinza.

“É um lugar-comum que não há solidão que se compare à de quem se vê sozinho numa multidão”
O misterioso caso de miss V. – Virginia Woolf


Cinéreo seriam todos os dias que se seguiriam após a sua partida. Foi talvez em meados do ano retrasado que sua vida foi inundada de plena esperança e momentos vívidos de felicidade. E mesmo nessa madrugada de profunda melancolia poderia se lembrar de situações que lhe arrancariam do rosto um sorriso bobo. Talvez seja tão-só um dia, em que descompromissadamente decidiu olhar para aquele mesmo corredor que na maior parte do tempo está inundado de pessoas e conversas inúteis. Gostaria de ter todas as lembranças boas que aquela presença imprescindível lhe causava, mas, sabia que com o tempo a memória lhe falharia. Pensou em todas as suas palavras e nas folhas com sua escrita guardadas na esperança que ficassem longe do estrago do tempo. Com o passar dos anos as folhas se tornariam amareladas assim como a ferrugem que corrói os trilhos que a pouco indicavam um caminho. Nada resiste a presença do tempo, da distância, da chuva e da saudade. Os finais felizes somente ocorrem em filmes, e os filmes só são vistos por quem se habilita a colocá-los em algum aparelho de reprodução; sonhos não ocorrem a esmo e quando ocorrem são levados com a dor de uma partida. Decerto nunca houve um tempo em que de fato se arriscaria a dizer que não sofreria com partidas e as longas despedidas. É ignorante e quase ilógico pensar que esse momento não aconteceria, e ainda assim, não consegue evitar aquela dor que dilacera a alma e permanece escondida. Sob certas luzes a esperança se vê esfacelada e a realidade corta como navalha.