Sempre que escrevo um poema, um poeta de verdade se remexe no túmulo, por dor ou por pena

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

que descolorirá

Donde vem eu nem sei
Nem mesmo para onde vai
Se vai ficar muito tempo
Ou se partirá amanhã

Eu que tiraria um pincel do bolso
só pra pintar um sorriso no seu rosto.

sensatez



as cidades se erguem em pleno concreto
as pessoas passam sem se olharem
mesmo que por segundos

A vida segue adiante!

o passado não pode ser melhorado
não há presente, não há futuro.

A vida segue adiante!

o minuto em que dou esmola ao catador de papel que diz ter fome logo é substituído por mais um dia normal.

A vida segue adiante!

entre o concreto há outros tantos
total estrago do coração
da visão
do sentimento

amanhã não mais me lembrarei de você

A vida seguiu adiante!

na multidão de pessoas que andam pelas ruas não vejo ninguém
passo por você e não mais o reconheço.

permaneço sensata e só.

Senhor! arranca do meu corpo esse juízo
eu que nem sei se tenho juízo
ou corpo

terça-feira, 27 de setembro de 2011

sem título, sem nada

Ósculos, Amplexos
Ver sentir
Toques, gestos ?
O Eu contido .
A modernidade estraga as pessoas

(25 de junho de 2009)

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

de onde vem a calma

“De onde vem o jeito tão sem defeito?
Que esse rapaz consegue fingir
Olha esse sorriso tão indeciso
Tá se exibindo pra solidão
Não vão embora daqui
Eu sou o que vocês são
Não solta da minha mão
Não solta da minha mão”


E vem sem gosto de viver.

E não tem mais a força que tinha.

E dele nem mesmo me lembro o nome.

Não poderia perder esse tempo por nada.

Mas o tempo é a única coisa que se perde.


E não há velha casa, nem velha marca, nem velho coração.


Nem coração.

Comece por uma nova vida e uma nova canção.

Lembre-se de jogar as chaves fora.

Lembre-se de fechar a janela do quarto para que ninguém entre.


Não arranje desculpas, não peça para voltar no tempo, não diga que não deu certo.

Do certo e do errado só a gente que sabe.

E a gente nem sabe.


Lembre-se de jogar as chaves fora.

Lembre-se de fechar a janela do quarto para que a fumaça não saia,


E se você vai embora, vai bem, e tente não voltar.

E se desta vez ela é a senhora, não demora a volver.


Pare de cantar a velha música

e ouvir a velha música

e olhar para mesma porta em que um dia você a viu partir.


Tens agora a certeza do momento inteiramente vivo.

Ainda que falso construído.


A verdade simples tão exposta que é vista a olho nu.

A verdade mentira inteiramente exposta.

Como a ferida que um dia lhe causaram.


Tenha dó,

Entre Deus e o Diabo não há grande diferença.


E quis duvidar de todo o nada que sentia.

E chegou a pensar que esse nada pudesse ter sido causado pela demora ou recusa de outrem.

E nem mesmo chegou a pensar que é do nada que surgem as grandes coisas.


E não há TV para devolução.

E nem a Santa Chuva que já passou por aqui.


E a Flor serviu para que você encontrasse outro alguém.

E Deixa Estar Que O Que For Pra Ser Vigora.


E que seu barco encontre outro cais.

Que da vida e do amor eu nem sei mais.


Lembre-se de jogar as chaves fora.

Lembre-se de fechar a janela do quarto que quando o outro perfume sair vai ser pra não mais voltar.

domingo, 25 de setembro de 2011

último romance

E até quem me vê
Lendo jornal
Na fila do pão
Sabe que eu te encontrei
E ninguém dirá
Que é tarde demais
Que é tão diferente assim
Do nosso amor
A gente é quem sabe, pequena...

Depois da primeira vez que a viu, pensou que seria realmente o fim dos encontros organizados pela ordem errada do universo, uma vez que, pessoas legais poucas vezes eram vistas. Somente uma semana depois os pensamentos entraram na ordem correta em sua cabeça, e foi quando notou que na verdade aquele pode não ter sido um encontro casual. Em algum lugar, com hora e data agendada estava marcado que eles se encontrariam, e disso não poderia fugir.

Tanto foi que depois que colocou as coisas em ordem na sua cabeça, lembrou-se que na verdade já havia encontrado com ela em outra ocasião, ocasião esta, que ela não se lembraria ainda que fizesse grande esforço.

Na noite seguinte, ainda na tentativa de estabelecer uma lógica causal, arriscou rememorar suas últimas escolhas, já que, qualquer decisão diferente –inclusive ter decidido não ir tomar café– poderia ter alterado toda ordem de atitudes posteriores, o que faria sem dúvida, que o caminho fosse distinto.

Inútil tentativa, voltou ao mesmo ponto inicial no qual simplesmente a encontrou aquele dia em que decidiu sair de casa para tomar café.Nem gostavam tanto de café, mas contra o destino arrumado pelos deuses nada se pode fazer, e foi então que se encontraram.

Talvez esse tenha sido o dia de todos os outros que se seguiu em que menos foi achado assunto. Destarte, foi o caminho para uma série de novos assuntos que ficaram em entrelinhas de uma conversa nada fortuita.

Mas os deuses que unem nem sempre ficam perto tempo suficiente para evitar que os caminhos tomem rumos opostos. E se é dado ao homem a condição de escolha tudo vai por água a baixo.

...

- Alô?

- Alô, é você?

- Claro que sim, como que você está?

- Do mesmo jeito.

- Então deve estar bem, pois lembro que a última vez que nos vimos você não estava às traças.

- É.

- Né.

- Mas e você, arranjou alguém?

- A gente sempre arranja.

- Ah. Você ainda pensa em mim?

- Só quando me sobra tempo, não é muito.

- Vou ‘praí’ te ver.

...E ir onde o vento for
Que pra nós dois
Sair de casa já é se aventurar”

sábado, 24 de setembro de 2011

o anjo mais velho

Se encontraram em um dia verão e caminharam pelo parque. E depois disso se viram poucas vezes. Cada dia que passava parecia convergir para um todo em que o amor chegaria ao ápice. Mas nada disso aconteceu. As horas que passaram juntos eram boas, mas não o suficiente.

Ela saiu então pela porta do quarto e decidiu não mais voltar. E talvez hoje ele não pense mais no dia em que ela foi embora. Não trocaram cartas, não deixaram bilhetes, não almoçaram juntos. Viveram duas semanas ou menos, de forma que, agora poucos momentos seriam lembrados.

Virou a página e não houve perseguição em nenhum lugar. Às vezes se encontravam, mas nada que fizesse com que a chama, se é que ela um dia existiu, (re)ascendesse. Talvez em algum momento suas almas se encontravam, naquele exato instante em que nenhum nem outro saía com os amigos, preferindo ficar em casa com seus livros e discos. Mas até nesse momento um poderia impedir que a alma chegasse ao outro lado.

Mas isso não era falta de amor, não era falta de nada. Era o simples deixar-se levar sem nenhum caminho pré-concebido. Sem nenhum caminho já imaginado porque um gesto ou atitude fez com que tudo se rompesse em menos de um segundo. Todavia não se perdeu de forma a fazer com que a atitude do outro causasse repulsa ou desamor. Apenas se foi.

Nenhum motivo importante que justificasse qualquer instante.

De qualquer forma, quando ele deixou que ela passasse pela porta, entregou novamente sua sorte ao acaso, e nesse momento pode ser que algo irremediavelmente tenha se perdido.

"E o fim é belo incerto... depende de como você vê
O novo, o credo, a fé que você deposita em você e só

Só enquanto eu respirar vou me lembrar de você

Mas só enquanto eu respirar."

terça-feira, 20 de setembro de 2011

socorro

E poderia dizer que seu coração voltou ao estado de inércia original. Sem nenhuma força física que o impulsionasse, além do simples bater para bombear o sangue. Só poderia guardar nesse momento ódio, uma vez que, todos os outros laços foram desfeitos .

Mas nem ódio sentia.

Talvez um impulso qualquer de um eu quero estar com você agora que acabaria no minuto da recusa. Não há motivo afinal, para qualquer demonstração de sentimentos, não há sequer motivos para se ter.

Não há vida lá fora, tudo se passa dentro da História de um livro qualquer, ou dos amores platônicos que decide e (des)decide ter quando bem entende.

E seu corpo não deixaria de ser um depositório de prazer, estes verdadeiros. Em qualquer momento.

E agora aceitaria qualquer convite descompromissado – e somente estes – para uma noite qualquer . Um simples sanar de prazeres carnais . Momentos sem nenhuma necessidade de repetição.

“Socorro, alguém me dê um coração
Que esse já não bate, nem apanha
Por favor, uma emoção pequena
Qualquer coisa
Qualquer coisa que se sinta
Em tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva.”

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

o mundo é um moinho

“Ainda é cedo amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora da partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

Preste atenção querida
Embora saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és...

E me disseram uma vez que após determinado tempo o coração se acostuma. Pura mentira. Disseram também que quando não utilizado por muito tempo ele morre. Pura mentira. Até me disseram que Deus era amor. E mais uma vez fui enganada. E na vida essas são umas das muitas mentiras que nos contam. Quando na verdade os tombos são cada vez de lugares mais altos, e ninguém se acostuma a cair.

...Ouça-me bem, amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho.
Vai reduzir as ilusões a pó

Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com os teus pés”

tudo vai ficar bem

Em setembro de 2011 começava-se a desencadear um processo praticamente sem volta. Era o momento em que se tomava à consciência o ser histórico. A terra ainda fazia seu movimento de rotação, translação, revolução. Mas as estações haviam perdido a sua razão de ser. Era o momento em que se encontravam as razões para o processo em si. A ideia de que se caminha para o Paraíso há pouco se perdera. A revolução não é mais retomar ao início, porque o início não mais importa. O exato momento em que se ri do passado; no qual não há processo e sim ruptura. O antes seria superado para a realização de um marco futuro. O espaço pleno das utopias.

“Sé que todo va a estar bien
Lo qué no sé es se sobreviviré
Sé que todo va a estar bien
Lo qué no sé es se yo me salvaré

o dia em que eu o encontrei

“São aqueles que vêm do nada
e partem para lugar nenhum.
Alguém que aparece de repente,
que ninguém sabe de onde veio nem para onde vai
A man out of nowhere.”

(Nelson Brissac Peixoto: Cenários em Ruínas)




O dia que eu encontrei o homem da minha vida.
Ele tinha os olhos pequenos e o cabelo bagunçado.
Usava jeans e camiseta.

De tão inteligente poderia falar sobre qualquer coisa this world
E conheceria qualquer coisa.
E teria piadas para todas as situações.
E filmes.
E nada.

E poderia ser o melhor em tudo.
E até o que havia de pior dentro dele eu não me recusava a conhecer.
E entenderia.
Inventaria horas só para que seu dia fosse maior.
Mesmo que a tristeza fosse mais profunda.

De tão distante e sozinho eu nunca pediria nada em troca.
E não importaria.
E isso não era (des)amor ou falta de amor próprio.
Só era.

E é certo que cada um vê a vida da forma como quer.
E é feliz como é.

O dia que eu encontrei o homem da minha vida.
Ele tinha os olhos pequenos e o cabelo bagunçado.
Usava jeans e camiseta.

Acho que era a pessoa mais triste this world.
E parecia que era minha aquela solidão.

De tão lindo poderia ser o que quisesse ser.
E seria qualquer coisa.
E teria explicações para todas situações.
E sonhos.
Só precisava querer.

Ele decidiu partir.
Pediu para que eu não o seguisse.

E aquela garota a que eu poderia chamar de eu.
Nada mais poderia fazer.
Ainda que em sonho desejasse todo o bem do mundo a ele.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

quem irá nos proteger?

“Meu bem, meu bem, meu bem
Ouça o mau tom do alheio

Quem irá nos proteger?

...

E talvez não fosse para sempre, mas quem iria saber? Há pouco havia desacreditado de Deus e de todos seus caminhos feitos. Não importava o que viria a ser, não poderia perder mais tempo, não havia dúvida, nem lugar comum. Foi o simples deixar de acreditar em uma força interior que revelaria o quão duradouro seria, para um deixar-se levar. Não importava os caminhos doutros. Não importava mais se era falta, se era amor, se era uma coisa qualquer. Não era preciso respostas. E ainda que o mapa astral dissesse que eles dariam certo, não seria necessário. Tudo havia voltado ao normal. Poderia enfim descansar.

Colocou um ponto final nas longas esperas e nas noites com a cama vazia. E se é um intento ou mal intento não importa. Não é a busca de respostas, é a coisa em si. Ela espera, somente espera que dê certo, e se não der é só colocar um jeans novo e pintar o mundo de outra cor.

Alguma coisa quando estava dormindo continuava acordada. Então não importaria, era isso ou mundo todo de ponta cabeça. Porque não importaria o futuro, entre a experiência e a expectativa existia o momento, e esse era insubstituível. Nada poderia mudar das horas em que passam juntos ouvindo uma música qualquer naquela caixa de som antiga, quando a janela do quarto é fechada ao meio dia só para virar meia noite, onde os sonhos enfim estão seguros. E não mais se surpreende quando o pega sorrindo sem motivo aparente algum. E não importa nem mesmo o que ele está pensando nesse momento. Não há motivo para transpor os óculos e seus olhos semifechadossemiabertos para entender qualquer coisa da alma.

E é bom esse estar junto agora. E eterniza qualquer momento, pois dá vida nada se sabe, e amanhã pode não mais o ter.

...A inveja é a vontade de ter o que não é seu
O ciúme é o medo
De tomarem o que é meu
Não nos sirva a ninguém
Dê à ingenuidade adeus
Muitos querem se vestir
Do que não lhes fica bem
Sempre imitando o alheio
Maledicenciando em vão
Não nos sirva a ninguém
Dê à ingenuidade adeus

Príncipe sem um tostão
Sim. Era pra você a carta de amor
Que disseram ser para um terceiro
Preparei a nossa casa
Chame alguém para um café
Nosso amor é nossa cama

Não empreste a ninguém, não

terça-feira, 13 de setembro de 2011

conta outra

É bem certo que quando termina algo na vida, pelo mínimo de consideração você deve passar um processo de luto. Então, use preto, chore, beba conhaque, faça drama, sofra. Compre um maço de cigarros e fume-o até o fim. O importante é que algo dentro de você indique que você tem um coração, não desses de pedra. Não adianta, alguma coisa sempre termina. Quase nunca da melhor forma. Só resta escolher até quando vai cultivar a tristeza. Até quando irá se permitir sofrer. Se é bem certo que o seu eu - lírico age melhor nos dias cinzas, mande-o para o inferno, e que o diabo o carregue. Vá para o primeiro boteco e brinde o desapego. Tatue um trevo de quatro folhas e espere pela sorte. Lá fora a vida sempre continua.

“Conta outra,

Nessa eu não caio mais

Já foi-se o tempo em que eu pensei que você era um bom rapaz”

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

setembro

Busco respostas e encontro apenas o vazio. O barco parte para longe do cais. Em breve não mais o verei. Sinto o cheiro de tinta do barco recém pintado de vermelho. Não lançarão sua ancora no meio do mar. Os ventos fortes talvez nos destrocem. Estarei à deriva por um longo tempo. Longe da fortuna de todas as suas coisas. A espera de um dia frio em que se possa enfim descansar. O barco à deriva no mar me afastará dos longos pesadelos noturnos. Estaremos bem longe do cais. No meio do mar as estrelas são mais visíveis, o céu é mais bonito, “é doce morrer no mar”.

“Chega o Sol, mas não chega o amanha.
Chega a chuva, mas não chega o frio.
Chega você, mas não chega o amor.”

rafael de lima fonseca

piano bar

Então me ligue, diga que foi ao cinema, que foi assistir lanterna-verde. Que se mudou para o Rio de Janeiro, que não tem mais o sotaque mineiro. Diga que vai fazer astronomia, que desistiu dos concursos. Que voltou a dar aula. Que desistiu de deixar o cabelo crescer. Diga que eu fico mais bonita com o novo corte de cabelo. Que eu pareço mais inteligente. Diga que ainda gosta de HQ’s. Que eu posso voltar a ser a Harleen Quinzel. Que você conheceu coisas novas. Diga que amanhã você vai me ligar para irmos ao cinema. Porque eu tenho tanta coisa para te contar. Conte-me sobre os seus casos de amor. Aquela menina, a única, eu encontrei esses dias. Conte-me até os repetidos. Liga só para me fazer sorrir. Só para me dizer que ainda tem o mesmo carro. Só para me contar do seu tempo de faculdade. Só para me explicar mais uma vez as leis da física. Só para eu poder dizer mais uma vez que a lua está tão bonita que chega a doer por dentro. Só para colocar as músicas com aquele sotaque carioca que eu detesto. Só para cantar. Só para fazer as batidinhas da bateria no meu corpo. Conte-me qualquer coisa que eu ainda não sei. Fale-me sobre seus projetos. Diga que leu um livro novo. Que a gente precisa fazer alguma coisa juntos. Que a biblioteca continua a mesma. Que nunca vai gente bonita lá. Diga que você desistiu de seduzir as pessoas com bilhetinhos no carro. Que você largou o romantismo. Diga que a vida segue como sempre. Que eu só quero que você me pergunte se eu estou bem, para eu poder contar tudo de novo. Diga que eu estou emagrecendo. Que a gente vai dar volta de carro até a minha raiva acabar.

Liga, que eu já ouço Beatles, e que a gente pode ir a um show de verdade. Liga que daqui do outro lado do mundo ninguém precisa saber de nada. Diga que tudo vai passar.

Liga, que eu preciso do teu colo de novo.

Can't Take My Eyes Off You

Como pode me atirar do precipício após me levar até ele? Como pode depois de tanto tempo desacreditando em tudo que era dito amor, fazer com que tristezas se repetissem? Nunca pedi socorro, nunca tive nenhum estado de fraqueza. Nunca corri para a estrada e nem pedi ajuda. Nunca mais acreditei que poderia sofrer. E como pode tudo desaparecer após segundos, como pôde me atirar do precipício? Nunca acreditei em promessas e por isso não as fiz, e sei que também não fizestes. Você apenas estava lá acenando na beira da estrada e fazendo pedidos ao acaso. Você apenas deixou que eu me apaixonasse e no dia seguinte partiu. Nunca fizemos planos de verdade e mesmo assim fica aquele gosto amargo de uma vida que não foi. Sei que fizestes sem pensar, sem dimensão, e assim também o fiz. Sei que não se dá amor pedindo amor em troca. Sei que pode não ser uma via de mão dupla. Mas nem tudo que a gente sabe, entende. Não é como apertar o gatilho, ou tirar a mangueira do gás e esperar pela morte. É involuntário, melancólico, lento e sofrido.

Não quero ser. A mão que guia o mundo nada faz a meu favor. Não há nada em si a ser descoberto nem encoberto. O tiro do revólver foi dado e não há salvação em nenhuma dimensão. Naquele mesmo cais o barco afundou, e só sobraram destroços que não mais tomarão forma. Naquele mesmo dia em que me sentei ao seu lado no banco da praça sabia que alguma coisa irremediável aconteceria.

Você apenas estava na estrada acenando e fazendo pedidos ao acaso. Você apenas me atirou do precipício. Quando o sempre é nunca.

"And so it is

The shorter story

No love, no glory

No hero in her sky"


inspiração original: http://papoprivada.blogspot.com/2011/07/falsos-poetas.html

Sun In My Mouth

De tudo que eu sei nessa vida não sei esperar. Isso me consome por dentro. Há total lesão de sentidos , de senso, de razão. Tudo se embaça e as pessoas nas ruas não passam de figurantes de uma história sem história. Ando sem destino por caminhos imaginários. Nem em pensamentos estou segura. A escuridão toma conta do ser e por certo tempo o coração dispara. Em meio às sombras do passado nada reconfiguro acerca do presente. As coisas deixam de ter razão de ser. Tudo se corrói como o metal. E nada mais resta além do não acreditar no mundo, no homem, em Deus. Tudo não passa de solidão, a espera é o pior dos males. Branco e preto, branco e preto, preto e preto.

E se do pó vim, é dito que ao pó voltarei. Minha única certeza.

"Alive with closed eyes

To dash against darkness"

Clocks

Linhas que não poderiam ser mudadas e caminhos que talvez nunca mais se cruzem. Das trevas que emergem em meio a escuridão nada poderá se salvar. Não há tempo. O fogo queima e em pouco tempo tudo se desfaz. As cinzas não são reconstituíveis. O tempo consome tudo, muito se perde. Só vivemos uma vez nessa vida. De resto, todas as coisas se consomem, somem engolidas pelo tempo. Um buraco negro em algum lugar do espaço faz com que nada volte.

E não mudaremos o passado e nada sabemos sobre o futuro. Dos dias nem mesmo poderei dizer que pertencem a Deus. Deus faz tempo esqueceu dos mortais. Não há mal, não há bem, apenas atitudes que geram ou deixam de gerar sentimentos, estes incontroláveis. Incontroláveis mas possíveis de se esconder, e se esquecer e de não mais se ter. Não jogue as chaves fora.

Saia ou retire-me do incêndio enquanto há tempo. Breve tudo se findará.

"Come out upon my seas

Cursed missed opportunities

Am I a part of the cure?

Or am I part of the disease? Singing"

domingo, 11 de setembro de 2011

sob os morangos mofados

Pelo tempo que durar o maço de cigarros, pelo visto não muito. Se eu trouxesse muito lentamanente à memória algumas coisas boas talvez não as encontrasse. Da janela do meu quarto posso ver a lua, somente posso. No dia em que Júpiter encontrou Saturno fingimos não nos reconhecer. Como velhos desconhecidos passamos pelas ruas. Do outro lado da vida, do mundo. Volta o velho gosto, a velha nãoacreditanssia, as velhas palavras. Dos dias em que nada acontece aos que se abre uma nova garrafa de conhaque. Vai ver adoça a vida. Pelo tempo que durar esse sentimento. Que durou.

Quando a vontade de estar perto é substituída pelo medo, cruza-se a linha tênue. Dos dias de volta no parque, nada restou. Quando o medo torna-se a premissa, nada resta. Naquele lugar em que costumávamos afogar as nossas mágoas, que talvez sequer existissem.

Só agora me ocorreu que talvez nada tenha existido e nada tenha acontecido. E tudo não passou de uma fantasia, inventada descompromissadamente para que não passássemos sozinhas as horas em que cansados de estudar nos víamos. Sozinhos e frágeis, e vazios de qualquer utilidade para o mundo. Tristes seres errantes que jamais querem acertar.

Enquanto durar o maço de cigarros prometo a mim que não o esquecerei. E quando lembrar das horas do vazio, o farei como a única coisa que restou de um caso que durou menos que o cair das folhas do outono. Do dia em que eu poderia ter sido a mulher mais feliz do mundo. E nada mais que um dia seria suficiente parar retirar da geladeira os morangos mofados.

Não mais atravessarei o deserto até o local onde você se encontrava. Você era apenas uma miragem. E as estrelas mudam de lugar, os móveis se embaçam, e o ponto fixo – que era a porta – não mais existe. Contemplo descompromissada o vazio. Viver é cada dia mais perigoso.


"No entanto (até no-entanto dizia agora) estava ali e era assim que se

via. Era dentro disso que precisava mover-se sob o risco de. Não sobreviver,

por exemplo - e queria? Enumerava frases como é-assim-que-as-coisas-são ou

que-se-há-de-fazer-que-se-há-de-fazer ou apenas éofinal-que-importa. E a

cada dia ampliava-se na boca aquele gosto de morangos mofando, verde

doentio guardado no fundo escuro de alguma gaveta."

(morangos mofados-caio fernando abreu)

sábado, 10 de setembro de 2011

relicário

O sol daquele dia era o mesmo de todos os outros. A lua um dia havia lançado seu olhar benevolente sobre nós. A noite era suficientemente clara para se observar as estrelas quando sentei-me a primeira vez ao seu lado, naquele banco de praça. Estar nesse imenso mundo de pessoas que jamais se encontram faz fantasiar outro, melhor. Os mundos possíveis de Leibniz amenizam meu sofrimento, em um mundo possível serei feliz. Aos deuses do acaso não entregarei mais nenhum encontro. O relógio que até pouco tempo passava depressa marcou sua última badalada, mas nenhum outro mundo é capaz de remover essa sensação de fim. Fim de várias convicções e certezas que a pouco haviam voltado a ser. Uma ideia incoerentemente bela havia sido proposta, uma convicção foi colocada em xeque. O mundo é mais bonito no cinema, e é a vida que imita a arte e não o contrário. A recusa em tentar aceitar o que um dia todos disseram foi a premissa para inventar uma história outra. E não poderia esperar essa fuga, esse não habite-se. Encontrei a última pessoa que queria ter encontrado nessa vida. Quase um personagem literário passível de várias interpretações. Um falso poeta que não sei dizer se finge sentir que é dor a dor que deveras sente. Risco com caneta a fé do mundo. Através do seus olhos meio fechados pensei ter encontrado abrigo. Tudo não passou de um sonho. Dos dias que passaram pouco sei dizer sobre o que foi real. Não era preciso sorte, a bolinha que toca na rede e pode por um minuto fazer com que se ganhe ou perca a partida de tênis não é uma metáfora para as decisões humanas. Era preciso apenas uma escolha, apenas uma oportunidade. A sorte já havia encaminhando o começo, não se pode contar com ela para sempre. Foges assim, sem justificativas ou razões. Risco mais uma vez com caneta a fé do mundo. E digo que encontrei quem não deveria ter encontrado, porque risquei a ferro e fogo a fé no homem. De tudo sobrou a melancolia cinza fria de uma história que sequer chegou a ser. A massa cinza da cidade fria ergue-se sobre o pálido céu. Hoje vejo apenas uma figura inanimada. Parto dizendo adeus.
Acordo, tudo não passou de um sonho.


"milhões de vasos sem nenhuma flor.

o que você está dizendo?
o que você está fazendo?
por que que está fazendo assim?"

quarta-feira, 7 de setembro de 2011