Sempre que escrevo um poema, um poeta de verdade se remexe no túmulo, por dor ou por pena

domingo, 29 de julho de 2012

ocaso

it needs some new songs

Há em mim qualquer coisa dessas sem aclaração. Há uma necessidade de deixar-se namorar e seguir com isso até o momento de poder enjoar e mudar o foco. Há em mim uma necessidade de sentir medo pelo puro prazer de poder correr. Não sei dizer como surge às vezes e como crio o desejo. Certa de que nessas horas me difiro. Imersa nessa tenra ideia de aspiração. Descartando quando não mais me serve. Vivendo ao bel-prazer de ser livre.
Admirando como a única coisa que resta e desejando porque tantas outras vezes consegui. pr’eu ser tema desse teu compor.
Porque eu quero cansar de te ver passar, cansar de te ouvir, cansar de ler o que você escreve, cansar de ver você.

Abro uma garrafa de cerveja, acendo um cigarro. A vida voltou a ser.

Só vou se for com ele
Eu tenho medo de avião
Se eu fico longe dele
Eu perco o norte e o chão
Só quero saber dele
E nada mais importa.

o café quente

O café quente. Um não entender de tanto querer, assim às claras. Não deu pra evitar, fugir, mentir, esconder-se. Quem dera me livrar pra sempre de mim mesmo é só me reencontrar lá no teu doce abismo. Involuntariamente passei por você, voluntariamente decidi passear de volta. Preenche o vazio da falta de sono com algumas sérias palavras. Zera-me e nada mais te peço. Arranca de mim esse medo mortal de viver. Escrevo e imagino; a mão segurando a caneta e a vontade apertando o peito. Y el que quiera creer que crea. Y el que no, su razón tendrá. Y que la escuche quien la quiera escuchar. Doce ilusão e bendita loucura. Não posso mais me esquecer do momento em que me encontrei em ti. Seu firme aperto de mão, seu molhado beijo que nem sei. Esses são dias de suspiros tensos.

“Lavrador ou semideus. Queima de amor, seja como for
Tema de Amor

morre a insensatez

Hoje,
29 de julho de 2012,
eis que morre o Insensatez
e nasce
Cavar flores sem lhe ver!

Outrora cantou Belzinho:

Nunca mais você saiu à rua em grupo reunido
O dedo em V, cabelo ao vento, amor e flor, quero cartaz

No presente a mente, o corpo é diferente
E o passado é uma roupa que não nos serve mais

segunda-feira, 16 de julho de 2012

estátua

" MALFADADO E MISTERIOSO HOMEM! Desnorteado no esplendor de sua própria fantasia e tombado nas chamas de tua própria juventude! De novo, na imaginação eu te contemplo! Mais uma vez teu vulto se ergueu diante de mim... Não, não como te encontras, no frio vale, na sombra!, mas como deverias estar, dissipando uma vida de sublime meditação naquela cidade de sombrias visões, tua própria Veneza, que é um Eliseu do mar querido das estrelas, onde as amplas janelas dos palácios paladinos contemplam, com profunda e amarga reflexão, os segredos de suas águas silenciosas "

o visionário
edgar allan poe

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“A Estátua recuperou a vida!” Não, não recuperou.

Jaz sobre a cama o corpo do que outrora foi um homem. Pergunta-se ao deus do Acaso em que momento mesmo deve-se sucumbir ao desejo, mas este nada responde e talvez o deus do Caos aqui nos caiba com melhor resposta. Nenhum desses deuses, entretanto arrisca-se a fazer qualquer contato com um reles mortal e a vida aqui no mundo segue adiante. Segue?!
Quando, um instante após o derradeiro desfecho, segue-se aquele mesmo caminhar a passos curtos e a mesma velha e inútil existência. Aquela lúgubre existência a que tantos bons homens cedem. Aquela melancólica e mórbida vida. E com bons sentimentos se desfaz o mundo.
Ouço três batidas na porta, abro e não vejo ninguém, e não esperaria encontrar alguém do outro lado da porta de madeira de cor marrom como os caixões. Com profunda atitude de repúdio fecha-se a janela, e com singularíssimas atitudes de pequenas culpas os homens destroem o mundo.
Assim, sem pensar nos prazeres da carne eleva-se a vida a um patamar que eu jamais reclamarei o posto.
Achei-me remexendo alguns livros de horror, de mistério e morte, como alguém que não tem mais nada a esperar. Como alguém que finalmente sucumbiu à doença que atingiu seu grande amor. Beatriz no espelho, Beatriz em suas inúmeras faces, e tudo acaba quando sobre todos os pontos do Aleph o que resta é apenas Beatriz Viterbo.
Perder a fé nas coisas é algo que atinge a todos, afinal.

domingo, 15 de julho de 2012

Somebody That I Used To Know

Não foi pela forma como você pronunciou cada palavra, nem pelos seus olhos miúdos. Não foi pelo modo como você se vestia, muito menos pelo seu tipo físico. Não foi pela maneira que nos conhecemos porque nem me lembro como nos conhecemos. Não foi pelo modo inflado que você entrava em uma discussão, porque você nunca fazia isso pessoalmente. Não foi nada disso, mas talvez tenha sido isso tudo.

Ergueram cercas ao nosso redor e você, fraco como sempre foi, enredou-se em cada uma delas. Posso ver apenas alguém que sangra, alguém para sempre marcado pelas amarras que um dia o prenderam.

Enquanto a playlist country roda na sua caixa de som, existe vida do outro lado da rua. Enquanto você inventa e reinventa cada tristeza, existe um mundo do lado de fora do seu apartamento. Enquanto você perdeu tempo tentando se mostrar envolto em uma máscara, alguém desceu as escadas do seu apartamento para nunca mais voltar. Enquanto você morre de amor, a pessoa que você tanto ama já se apaixonou por outro alguém.

Você é incapaz de olhar para o lado e ver que algo bom pode acontecer. Incapaz de ser metade dos contos que você lê e metade do homem que te inspira a escrever. Você não carrega a tristeza do mundo, você é a tristeza do mundo.

Você nem precisava ser tão ruim, mas esforça-se para isso.

Você não precisa e nem merece amigos.

Você não amaria meu sorriso, nem meu calor, nem minha solidão, nem minha condição, nem por uma noite e nem pela eternidade, porque você é incapaz de amar.

E eu descobri que minha vida pode ser bem mais que o vislumbre de um garoto triste que passa a maior parte do tempo trancado em um quarto, em um apartamento, e que se debruça sobre a janela na espera inútil em que ninguém vai aparecer. Todos já o esqueceram.

But you treat me like a stranger and that feels so rough
No, you didn't have to stoop so low
Have your friends collect your records and then change your number
I guess that I don't need, that though
Now you're just somebody that I used to know.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

um personagem de dostoiévski jamais será Borges.

“Sou um homem doente... Um homem mau. Um homem desagradável”
Memórias do Subsolo - Fiódor Dostoiévski.

Disseram outrora que não se poderia entender ou prever o que faria o homem do subsolo. Que não se poderia compreender completamente o que seria tal homem. O ser dotado do mais mesquinho sentimento, mas ao mesmo tempo capaz de ser a mais dócil criatura. Um ser talvez, e sobretudo, indefeso.
Faz algum tempo conheci esse personagem dostoievskiano. “Um ser que vem do nada e parte para lugar nenhum. Alguém que aparece de repente, que ninguém sabe de onde veio nem para onde vai. A man out of nowhere”. Diria Nelson Brissac, se aqui me couber a referência.
Um ano, ou menos que isso, foi o suficiente para conhecê-lo, construir e destruir uma das coisas mais bonitas que já me aconteceu.
Um homem do subsolo nunca deixará de sê-lo.
Aqui caberia outro personagem dostoivskiano, aquele eterno marido, um complemento da esposa, mesmo possuindo indiscutivelmente personalidade própria. E, no fim das contas, complementos são sempre vazios e mendigos de atenção.
Resta apenas uma referência a Hawthorne Em meio à aparente confusão de nosso mundo misterioso, as pessoas estão ajustadas a um sistema de modo tão preciso, e os sistemas ajustados uns aos outros, e a um todo, que, ao afastar-se disso por um momento, um homem expõe-se ao risco terrível de perder o seu lugar para sempre. Tal como Wakefield, pode tornar-se,por assim dizer, o Pária do Universo.Um homem do subsolo jamais deixará de sê-lo.

Borges jamais se orgulharia disso.