Sempre que escrevo um poema, um poeta de verdade se remexe no túmulo, por dor ou por pena

terça-feira, 30 de abril de 2013

And the Raven, never flitting, still is sitting, still is sitting
On the pallid bust of Pallas just above my chamber door;
And his eyes have all the seeming of a demon that is dreaming,
And the lamp-light o'er him streaming throws his shadow on the floor,
And my soul from out that shadow that lies floating on the floor
Shall be lifted - nevermore!

The Raven - Edgar Allan Poe.

E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha cor de um demônio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão há mais e mais,
Libertar-se-á... nunca mais!

tradução por Fernando Pessoa.

N
E
V
E
R
M
O
R
E

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Morrer é uma merda



Morrer é uma merda. Não falo isso porque estou morta, quem dera pudesse ser Brás Cubas e compor essas memórias do além-túmulo.  Mas quando se morre a memória fica aí e as pessoas fazem dela o que quiser. É um eterno falar pelas costas. Espero que do céu ou do inferno as orelhas não queimem, não devem, assim como a mão não deve coçar indicando dinheiro. Morrer deve ser realmente uma merda, mas merda pior ainda é continuar  vivo e ver o eterno falar pelas costas, e não as nossas. Tenho usado muito a palavra merda, mas não se assuste caro leitor, ainda é menos impactante que desgraça, embora desgraça reflita melhor a atual situação. Nunca pensei que merda poderia ser uma palavra usada quase como eufemismo. Tenho perdido bastante tempo revisando os últimos acontecimentos, encaixando fatos, reclassificando frases a esmo. Cada dia é uma descoberta nova e estúpida. Não sei quando isso vai parar. Logo eu, essa pessoa, que se pudesse deixava a vida sempre como está.
Agora tenho que conviver com a eterna desgraça de só saber a versão do Dom Casmurro.

domingo, 21 de abril de 2013

o amor e a morte





Caio escreveu, certa vez, em pequenas epifanias, que a perda  do amor é igual a perda da morte, só que dói mais. Parece hediondo e mesquinho pensar assim. Poucos temos coragem de assumir que é a pura verdade. Na morte, pouco a pouco, e involuntariamente, a memória nos trai e quando percebemos não mais nos lembramos de determinado traço da pessoa. Esquecemos sua voz, seu cheiro. Não estou dizendo aqui que essas coisas nunca voltem, basta pegar qualquer livro do Proust ao acaso para demonstrar em exemplos como às vezes essas coisas voltam à “vida”.  Na morte a dor é intensa e profunda, mas é a dor de um nunca mais, nevermore. Sabemos, e nossa mente e o nosso coração, que não encontraremos com a pessoa jamais, que ela não esbarrará conosco em certa esquina, que ela não nos telefonará e que não veremos fotos recentes espalhadas pela internet. Sabemos que ela está morta. Na perda do amor, a nossa mente também sabe – embora nos traia – que a pessoa morreu de certa forma, mas o acaso sempre está aí para brindar-nos com um encontro nesse mundo extremamente pequeno. A perda do amor dói mais. A perda da morte cava um buraco profundo, uma ferida aberta, mas que se sabe sem remédio. A perda do amor deixa a ferida aberta, sempre aberta para que se aperte até que saia mais sangue, tem remédio, mas não ao nosso alcance. A perda da morte tira do rosto das pessoas os traços que queremos lembrar. A perda do amor está sempre aí  nos lembrando que a pessoa está viva, mas morta. 

“Beatriz Viterbo murió en 1929. [...]
Nuestra mente es porosa para el olvido; yo mismo estoy falseando y perdiendo, bajo la trágica erosión de los años, los rasgos de Beatriz.” (el aleph, J.L.B)

quinta-feira, 18 de abril de 2013

terça-feira, 2 de abril de 2013

e a gente se pergunta se ama a pessoa por ela ser, ou se ama pelo que achamos que ela é.
e amamos. e amar é um mal sem remédio.

"Pues miente el oro Estrellas a su modo,
en el que vives, sin saber que mueres." Quevedo