Sempre que escrevo um poema, um poeta de verdade se remexe no túmulo, por dor ou por pena

domingo, 21 de abril de 2013

o amor e a morte





Caio escreveu, certa vez, em pequenas epifanias, que a perda  do amor é igual a perda da morte, só que dói mais. Parece hediondo e mesquinho pensar assim. Poucos temos coragem de assumir que é a pura verdade. Na morte, pouco a pouco, e involuntariamente, a memória nos trai e quando percebemos não mais nos lembramos de determinado traço da pessoa. Esquecemos sua voz, seu cheiro. Não estou dizendo aqui que essas coisas nunca voltem, basta pegar qualquer livro do Proust ao acaso para demonstrar em exemplos como às vezes essas coisas voltam à “vida”.  Na morte a dor é intensa e profunda, mas é a dor de um nunca mais, nevermore. Sabemos, e nossa mente e o nosso coração, que não encontraremos com a pessoa jamais, que ela não esbarrará conosco em certa esquina, que ela não nos telefonará e que não veremos fotos recentes espalhadas pela internet. Sabemos que ela está morta. Na perda do amor, a nossa mente também sabe – embora nos traia – que a pessoa morreu de certa forma, mas o acaso sempre está aí para brindar-nos com um encontro nesse mundo extremamente pequeno. A perda do amor dói mais. A perda da morte cava um buraco profundo, uma ferida aberta, mas que se sabe sem remédio. A perda do amor deixa a ferida aberta, sempre aberta para que se aperte até que saia mais sangue, tem remédio, mas não ao nosso alcance. A perda da morte tira do rosto das pessoas os traços que queremos lembrar. A perda do amor está sempre aí  nos lembrando que a pessoa está viva, mas morta. 

“Beatriz Viterbo murió en 1929. [...]
Nuestra mente es porosa para el olvido; yo mismo estoy falseando y perdiendo, bajo la trágica erosión de los años, los rasgos de Beatriz.” (el aleph, J.L.B)

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